REPRESENTAÇÕES DE SAÚDE E TRABALHO SOB A PERSPECTIVA DE SERVIDORES ADMINISTRATIVOS DE UMA PREFEITURA MINEIRA

DOCUMENTAÇÃO

Tema: Educação Física, Nutrição, Fisioterapia e áreas afins na Gestão, Educação e Promoção da Saúde

Temas Correlatos: Educação Física, Nutrição, Fisioterapia e áreas afins na Gestão, Educação e Promoção da Saúde;

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AUTORIA

Andréa Gonçalves Borges , Ailton De Souza Aragao

ABSTRACT
INTRODUÇÃO
Articulada ao campo Saúde do Trabalhador e a Teoria das Representações Sociais, apresenta-se um estudo sobre as representações sociais de saúde e trabalho de uma equipe administrativa em uma Prefeitura Municipal do Triângulo Mineiro.
A partir da década de 1970, a relação entre saúde e trabalho vem sendo discutida sob a perspectiva do campo Saúde do Trabalhador (ST), um movimento político e social difundido globalmente como resultado de um processo histórico de transformações no âmbito das relações de saúde e trabalho, que se iniciou durante a Revolução Industrial na Europa. Diante das mudanças no mundo do trabalho, concomitante ao aparecimento de novas doenças com nexo laboral, o campo ST contribui para a compreensão de aspectos do trabalho que vão além do modelo médico-curativo e do vínculo causal (LACAZ et al., 2020).
No Brasil, a relação saúde e trabalho foi legitimada pela Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, em que apresenta o trabalho como determinante social da saúde, conferindo-lhe centralidade como organizador da vida social. A temática Determinação Social da Saúde contribui com o rompimento das estruturas de poder, uma vez que promove reflexões sobre o impacto do modo de produção capitalista na saúde das pessoas (PORTO; MARTINS, 2019).
Os aspectos relacionados ao trabalho apresentam-se como uma medida de realização e de construção da própria saúde e, paradoxalmente, o sofrimento psíquico é inevitável, uma vez que o modo de organização do trabalho exclui o desejo e reprime a liberdade de comportamento (DEJOURS; BARROS; LANCMAN, 2016). A conjuntura brasileira deste início de século utiliza de mecanismos de gestão próprios da acumulação de capital que mantêm o trabalhador em um espaço, predominantemente, de desumanização, devastação do corpo produtivo, de adoecimentos, humilhações, de instabilidade e insegurança (ANTUNES, 2018).
Dentro da perspectiva apresentada, os estudos empíricos sinalizam que os impactos da precarização do trabalho estendem-se ao domínio do trabalho administrativo no serviço público, tanto associados às dimensões da saúde física, mental e social, as quais se inter-relacionam em uma complexidade de fenômenos que repercutem na vida das pessoas (PADILLA SARMIENTO, VILLAMIZAR CARRILLO; MOGOLLÓN CANAL, 2018; GODINHO et al., 2019; LOPES et al., 2021).
Deste modo, observa-se um potencial a ser explorado no que tange a relação entre as representações sociais de saúde e trabalho na perspectiva de servidores em funções administrativas no serviço público. A Teoria das Representações Sociais (MOSCOVICI, 2015) permite o acesso à realidade e reconhece a legitimidade dos saberes do senso comum, configurando-se como base metodológica para o conhecimento e análise da real condição dos sujeitos pesquisados.
Neste sentido, o estudo tem por objetivo compreender a relação entre as representações de saúde e os fatores relacionados ao trabalho que impactam no processo saúde-doença de servidores administrativos no serviço público municipal. Em observância aos aspectos éticos e legais de pesquisa envolvendo seres humanos, contidas nas Resoluções nº 466/2012 e nº 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde, o Projeto de Pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM, sob o Parecer nº 5.283.969.

METODOLOGIA
Trata-se de um estudo com abordagem qualitativa, composta de uma entrevista áudio-gravada com as perguntas: (1) Para você, quais estratégias são importantes para que você tenha saúde no trabalho? (2) Na sua opinião, o que o seu trabalho não tem mas precisa ter para que você tenha saúde?
Os dados foram obtidos em ambiente virtual, no período de março a maio de 2022, atendendo os protocolos de biossegurança em função da pandemia de Covid-19. As entrevistas foram transcritas na íntegra e as narrativas submetidas à análise de conteúdo na modalidade temática, sob o aporte da Teoria das Representações Sociais.
Participaram do estudo 26 servidores. Foram incluídos todos os servidores ocupantes do cargo de Oficial Administrativo que trabalham em uma unidade administrativa, com idade superior a 19 anos, de ambos os sexos, sem distinção étnica, que consentiram em participar da pesquisa e fornecer informações pelo método descrito no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foram excluídos os servidores que atuavam há menos de um ano na unidade ou que estavam de férias ou afastados por quaisquer motivos. 

RESULTADOS E DISCUSSÃO
As narrativas derivadas da entrevista foram submetidas à análise de conteúdo, o que resultou na delimitação da seguinte categoria temática: valorização das dimensões de saúde social, física e mental no ambiente de trabalho. 
Os achados revelaram que a dimensão social se configura como uma potencialidade no espaço de trabalho dos servidores administrativos investigados. Os participantes destacaram a saúde social como resultante das interações entre os colegas e chefia em um ambiente sem atritos e acolhedor. 
[...] o clima tem que ser acolhedor com os funcionários (P5) isso traz equilíbrio para desenvolver bem as atividades (P8) [...] porque quando a gente tem algum tipo de atrito, isso atrapalha todo o ambiente e fica desconfortável (P6) Porque lá eu sou muito bem acolhida e entendida. A relação com as pessoas é muito boa (P7).
O reconhecimento do apoio social como um fator regulador da saúde dos trabalhadores corrobora com os estudos de Godinho et al. (2019) envolvendo servidores públicos administrativos, em que destacaram o valor da cooperação e confiança nas relações de trabalho, além da associação entre a capacidade para o trabalho prejudicada e o baixo apoio social. 
Por outro lado, as dimensões da saúde mental e física são concebidas como fragilidades do serviço público administrativo no que tange ao processo saúde-doença dos servidores. Os resultados demonstram que os elementos relacionados às condições de trabalho, como as inadequações do mobiliário e a carência de recursos tecnológicos impactam a saúde. Os participantes estabeleceram uma relação entre a deficiência dos recursos tecnológicos, a sobrecarga de trabalho e o desgaste mental. E ainda, associaram as inadequações do mobiliário às dores osteomusculares. 
A gente fica o dia inteiro trabalhando sentado e dá aquela dor (P5) A gente deveria ter alguns mobiliários mais bem planejados [...] que forneça pra gente uma boa postura (P14) A gente não tem recursos tecnológicos que nos amparem pra executar o trabalho da melhor forma e a saúde trabalho é impactada diretamente nisso (P11) Se os processos de trabalho fossem mais automatizados não precisaria fazer tanta conferência manual e a quantidade de pessoas seria suficiente. É muito manual e muito papel, muita burocracia [...] acaba ficando estressada com o excesso de trabalho (P12) 
Quanto a relação observada entre a sobrecarga de trabalho e o desgaste mental, esta encontra similitude com os achados de Padilla Sarmiento, Villamizar Carrillo e Mogollón Canal (2018), em que destacam o fator estresse associado a carga de trabalho como o fenômeno que mais afeta a saúde mental. O estudo de Lopes et al. (2021) fortalece os argumentos ao destacarem que o mobiliário inadequado à postura afeta a prevalência de dores relacionadas ao sistema osteomuscular. 
As situações de trabalho identificadas são características da lógica produtivista no contexto neoliberal, resultantes dos cortes de gastos, do aumento da carga horária e da redução de pessoal (ANTUNES, 2018). Deste modo, conjectura-se sobre a vulnerabilidade do/a trabalhador/a administrativo para o sofrimento físico e psíquico no serviço público. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em atendimento ao objetivo de compreender as representações sociais de saúde e trabalho, sob a perspectiva dos trabalhadores, os resultados evidenciaram que as dimensões da saúde física, mental e social integram a realidade coletiva da unidade administrativa estudada, revelando a natureza multidimensional dos fenômenos associados à saúde dos trabalhadores.
O entendimento sobre o valor e as necessidades de saúde, ao mesmo tempo que servem de referência para identificação das potencialidades e fragilidades relacionadas ao trabalho, também permitem a busca de estratégias de cuidado, com o propósito de gerenciamento dos fatores de risco à saúde.

REFERÊNCIAS:
ANTUNES, R. Trabalho e precarização numa ordem neoliberal. In:  ANTUNES, R. O Privilégio da Servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Boitempo Editorial, 2018, cap. 2, p. 35-48. Disponível em: http://biblioteca.clacso.edu.ar/clacso/gt/20101010021549/3antunes.pdf. Acesso em: 10 jan. 2022.

DEJOURS, C.; BARROS, J. de O.; LANCMAN, S. A centralidade do trabalho para a construção da saúde. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, São Paulo, v. 27, n. 2, p. 228-235, maio/ago. 2016. DOI: https://doi.org/10.11606/issn.2238-6149.v27i2p228-235. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rto/article/view/119227. Acesso em: 11 jan. 2022.

GODINHO, M. R. et al. Apoio social no trabalho: um estudo de coorte com servidores de uma universidade pública. Revista Brasileira de Epidemiologia, [S. l.], v.22, p. 1-13, 2019. DOI: https://doi.org/10.1590/1980-549720190068. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbepid/a/t3pnVpNRbNLTMZTrPKWZdRR/abstract/?lang=pt#. Acesso em: 10 maio. 2022.

LACAZ, F. A. de C. et al. O campo Saúde do Trabalhador nos 25 anos da Revista Ciência & Saúde Coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 25, n. 12, p. 4843-4852, dez. 2020. DOI: https://doi.org/10.1590/1413-812320202512.21292020. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/K53bBt9rL5jfQbHcrWSdWMQ/?lang=pt#. Acesso em: 16 fev. 2022.

LOPES, A. R. et al. Fatores associados a sintomas osteomusculares em profissionais que trabalham sentados. Revista de Saúde Pública, [S.l.], v. 55, n. 2, p. 1-12, 2021. DOI: 10.11606/s1518-8787.2021055002617. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rsp/article/view/183903. Acesso em: 16 maio. 2022.

MOSCOVICI, S. Representações Sociais: investigações em psicologia social. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2015. 404 p.

PADILLA SARMIENTO, S. L.; VILLAMIZAR CARRILLO, D. J.; MOGOLLÓN CANAL, O. M. El trabajador universitario y su salud mental desde el modelo de creencias. Revista Ciencia y Cuidado, Cúcuta, v. 15, n. 2, p. 127–139, jul./dic. 2018. DOI:10.22463/17949831.1407. Disponível em: https://revistas.ufps.edu.co/index.php/cienciaycuidado/article/view/1407. Acesso em: 10 abr. 2022.

PORTO, M. F. de S.; MARTINS, B. S. Repensando alternativas em Saúde do Trabalhador em uma perspectiva emancipatória. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 44, e16, 2019. DOI: https://doi.org/10.1590/2317-6369000019018.Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbso/a/vCxmBVyCC6ssm4WzPZzt5cR/?lang=pt.Acesso em: 27 jul. 2021.

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