Perda e transformação dos espaços físicos e seus efeitos: uma reflexão psicanalítica

DOCUMENTAÇÃO

Tema: Pandemia, perdas, luto

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AUTORIA

Daniele John

ABSTRACT
Em meio a tantas perdas irreparáveis provocadas pela pandemia da Covid-19, testemunhamos mudanças radicais e inusitadas em nosso entorno. Em poucas semanas vimos as ruas da cidade ficarem vazias, silenciosas; as escolas fecharem, os hospitais transbordarem de pessoas muito doentes, o número de mortos crescer até que não déssemos mais conta de enterrá-los. O lá fora virou um lugar muto perigoso e o outro, fonte de contágio de um vírus mortal. A casa virou refúgio e cárcere e, embora os móveis estivessem aparentemente no mesmo lugar, sentíamos tudo diferente, esquisito. O familiar virou estranho.  
Perder os espaços físicos, ou perdê-los como eles eram antes, faz pensar sobre a importância desses espaços e também em como tal importância é muitas vezes negligenciada por nós, passando desapercebida. Como somos afetados pelos espaços? O que exatamente faz com que nos sintamos (ou não) acolhidos em determinado espaço? Que papel tem o nosso entorno para nossos laços com os outros/ Outro? Como o espaço físico participa da forma como nos sentimos e contribui ou não para as experiências que ali se dão? Como um espaço torna-se familiar ou estranho/sinistro?
Uma das minhas inspirações pra decidir pensar mais sobre essa temática, além das experiências trazidas pela pandemia, foi este trecho de um artigo de Luciana Pires (2020) sobre Dolto:
“Imaginemos uma criança que dá seus primeiros passos cambaleantes, partindo do sofá em direção à poltrona, desce ao chão e retorna engatinhando rápido e animadamente para o sofá de onde partiu. Chegando ao sofá, se apoia no assento, levanta-se e, mais uma vez, caminha em direção à poltrona.
 Françoise Dolto se intriga com essa cena corriqueira da primeira infância: mas por que é que a criança não faz o percurso de retorno ao sofá caminhando, já que acabou de aprender a andar? Munida de anos e anos de escuta e observação da infância, Dolto nos conduz ao entendimento singular de apreensão do próprio corpo e de si. Depreende que a criança entende que a recém conquistada capacidade de caminhar se deve a uma mistura de si, daquele ângulo da sala, daquele apoio no sofá, daquela luminosidade. Dito de outro modo, não é a criança que sabe andar, mas um todo amalgamado do corpo da criança e do entorno no qual está inserida. Como se fosse aquele percurso que a faz caminhar, e não ela quem caminha''. (p.55) 
Entre as inúmeras perdas que enfrentamos no período mais agudo da pandemia, tivemos nossos espaços físicos radicalmente modificados. Como as análises foram afetadas por tais mudanças radicais do espaço? Como foi para as crianças perder o consultório? Como sustentaram suas análises nos ambientes virtuais? O que se perde numa análise quando se perde seu espaço físico? Como foi para os analistas adentrar (via chamada de vídeo) as casas das crianças? E como foi para as crianças esse contato com a antes misteriosa casa do analista? E o que tudo isso nos ensina sobre o assim chamado setting/enquadre analítico?





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