Afinal, o que possibilita a uma criança ocupar o lugar de aluno? Fragmentos do trabalho de acompanhamento terapêutico de uma criança autista em seu percurso escolar.
AUTORIA
Silvia Bicudo
ABSTRACT
Sabemos que foi somente a partir da Declaração de Salamanca, em 1994, que o direito de toda e qualquer criança à escola foi estabelecido. De lá para cá muito se tem estudado, pesquisado e praticado para que a concretização de tal direito se dê para além de uma configuração protocolar. É verdade que o fato de uma criança estar matriculada e frequentar uma escola, não garante, por si só, que seja efetivamente vista e tratada pela comunidade escolar como aluna. Para que isso possa acontecer, é necessário ao menos um educador que a suponha nessa posição: aguçando sua curiosidade, convocando seu desejo de aprender, apostando em suas contribuições e descobertas, interditando quando necessário e assim por diante. Mais ainda, é essencial que tal educador sustente essa posição mesmo – e principalmente – quando a criança não corresponder às expectativas nela depositadas. Ocupar a posição de aluno é uma construção que se dá na relação e pela relação da criança com seus interlocutores numa via de mão dupla. No caso de crianças com algum entrave psíquico, como psicoses e autismos, essa construção fica ainda mais evidente na medida em que esses funcionamentos, por suas particularidades de funcionamento, convocam ainda mais os educadores à (re) invenção. Diante deste contexto, o presente trabalho discorre sobre como esta construção se dá na prática, a partir da apresentação de fragmentos do acompanhamento terapêutico de uma criança autista, por mim realizado, em seu percurso escolar na educação infantil. Partindo das dificuldades que a criança em questão se deparou no início de seu processo de alfabetização, apresentarei de que forma o olhar frustrado das professoras para tais dificuldades puderem se transformar, com a ajuda do trabalho de acompanhamento terapêutico, em criação, convocando a criança a uma produção autoral, por elas reconhecida e que teve como efeito na criança, a possibilidade de se engajar enquanto “mais um aluno” da sala.
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